Capítulo 16- O valor da água e a força do amor

Casaenbici, um caminho de corações abertos de Seabra a Abaíra

Por Nazareth Reales

BA 148, Seabra a Brumado – Foto: Nazareth Reales

Sair das rotas principais e se aventurar por estradas secundárias tem uma magia especial. Depois do trecho intenso entre Itaberaba e Seabra, deixar a BR-242 com seu tráfego pesado, velocidade e barulho se tornou quase uma necessidade.

Buscávamos tranquilidade, novas paisagens e a chance de conhecer comunidades menores. Por isso, seguimos pela BA-148, estrada que liga Seabra a Brumado, no interior da Bahia.

Essa escolha nos levou a descobrir o que o Brasil tem de melhor, o seu povo. Em uma região que não vê chuva há mais de dez meses, aprendemos o verdadeiro valor da água e a imensidão dos corações solidários.

Velame e Jatobá: uma aula ao ar livre

Francisco, Velame. nos lembrou do amor de Deus, dar sem olhar a quem. Foto: Nazareth Reales

Entre Seabra e Boninal, cruzamos os povoados de Velame e Jatobá. No parque principal de Velame, o espaço se transformou espontaneamente em uma sala de aula ao ar livre. As crianças tentavam falar espanhol, jogavam bola com Thomas e se encantavam com nossas bicicletas, enquanto os pais observavam curiosos e sorridentes.

Ao cair da noite, o parque virou nosso lar. Montamos a barraca sob uma cobertura, e uma moradora nos convidou para tomar banho e café na casa dela. A alegria das crianças encheu o lugar de risadas e movimento até tarde.

Thomas, Velame, presente de Francisco – Foto: Nazareth Reales

Na manhã seguinte, enquanto arrumávamos nossas coisas, Francisco apareceu. Ele tinha ouvido falar da “família colombiana que dormiu no parque” e logo nos ofereceu sua casa, um banho e um café da manhã.

Junto com a esposa, deu um brinquedo a Thomas, um gesto simples, mas cheio de amor. Aquele momento nos lembrou que, quando se doa com o coração, sempre se doa em abundância.

O calor humano de Jatobá

Rosélia, Jatobá. “Quem nos fez sentir o amor e o tempero de mãe.” Foto: Nazareth Reales

Ao meio-dia chegamos a Jatobá. Era domingo, e nenhum restaurante estava aberto. Enquanto procurávamos sombra, Amanda apareceu oferecendo frutas e água gelada. Pouco depois, sua mãe, dona Rosélia, nos convidou para tomar um lanche que acabou virando nosso almoço. Com o passar das horas, ela nos ofereceu uma casa vazia para passarmos a noite.

A acolhida de Roselia e sua família foi uma verdadeira lição de amor. Ela, uma mulher sonhadora que deseja conhecer o mundo, viu em nós uma forma de viajar através das histórias. Com ternura, nos deu o que tinha, alimentou nosso corpo com sua comida e nossa alma com sua generosidade.

Boninal: sincronia e propósito

Felipe, Boninal. mecânico e amigo. – Foto: Nazareth Reales

Seguimos até Boninal para consertar a bicicleta, que apresentava problemas na transmissão. O diagnóstico de Andrés era claro: era preciso trocar o pedivela. Então, conhecemos Felipe, do ateliê Word Bike, que nos recebeu com as ferramentas e a peça necessária. Mais uma vez, o universo colocou as pessoas certas em nosso caminho, no momento exato.

Família JN Bike , Boninal – Foto: Nazareth Reales

Entretanto, Boninal ainda guardava outra surpresa. Enquanto procurávamos onde acampar, chegamos à JN Bike e conhecemos Iany, Nilton e os filhos dele. Sem hesitar, eles nos ofereceram uma casa usada como depósito e oficina. Além disso, Andrés pôde trabalhar como mecânico, já que o antigo havia saído há pouco tempo. Foi uma troca perfeita, ajuda mútua e conexão sincera.

Foto: Acervo Pessoal

Durante a estadia, visitamos escolas e espaços esportivos, levando futebol e mensagens de motivação aos jovens: os sonhos se realizam quando trabalhamos por eles.

Escola ensino fundamental, Cabralia – Foto: Nazareth Reales

Depois, em Cabrália, repetimos a ação ao celebrar o Dia das Crianças com brincadeiras, futebol e muita inspiração. Assim, retribuímos o carinho recebido, espalhando esperança por onde passamos.

Piatã: o coração do café e da montanha

Após deixarmos Cabrália, seguimos em direção a Piatã, a cidade mais alta do Nordeste brasileiro, situada a 1.300 metros de altitude e conhecida pelo seu café de excelência e pelo clima ameno.

Paulo, Boninal – Foto: Acervo Pessoal

No caminho, surgiu Paulo, o nosso verdadeiro “anjo da guarda”. Ele parou para oferecer ajuda e contou que se prepara para realizar a primeira viagem de moto, além de namorar uma cicloviajante. Essa conexão imediata o fez cuidar de nós com enorme generosidade.

Durante o tempo em que permanecemos ali, nada nos faltou. Temos certeza de que o destino ainda cruzará novamente nossos caminhos.

Cristiano, fabricante dos melhores sorvetes da cidade – Foto: Nazareth Reales

Em Piatã, também conhecemos Cristiano, fabricante dos melhores sorvetes da cidade. Ele nos ajudou a contatar o secretário de Educação, que providenciou um local para dormirmos. Com esse gesto, Cristiano nos mostrou que ajudar, mesmo com pouco, é um ato de grandeza.

Abaíra: o ponto mais alto da jornada

Colegio Francisco Rocha Filho, Abaira. Foto: Acervo Pessoal

O trecho final até Abaíra exigiu muito esforço: longas descidas, curvas fechadas e uma subida que testou nossa resistência. No entanto, ao chegar, toda fadiga se transformou em gratidão.

A Prefeitura e a Secretaria de Educação nos receberam de braços abertos. No Colégio Estadual Francisco Rocha Filho, apresentamos o projeto Educação em Movimento aos alunos do ensino médio, compartilhando mensagens sobre o poder dos sonhos e o valor da educação como caminho para realizá-los.

Aula ao ar livre no parque principal de Velame. Foto: Acervo Pessoal

Cada quilômetro entre Seabra e Abaíra confirmou que as melhores viagens não acontecem apenas pelas estradas, mas pelos corações. Afinal, são as pessoas, com sua generosidade e amor, que dão verdadeiro sentido ao caminho.